sexta-feira, setembro 05, 2008

sintoma do que sinto

Uma ligeira dor de cabeça, surgida num curto espaço de tempo, ao fim de um longo dia de trabalho. Trabalho desse de secretária, em que se queimam as pestanas, se cansam os olhos, e se fritam os neurónios por querer produzir algo que ansiamos no mínimo inspirador. Não sei se para quem lê, se para mim que o executo. Não precisa ser algo realmente inovador, mas algo que dê que pensar. Não tem que ver com a beleza da escrita. Tem que ver com o conteúdo, semântica e sintaxe. Com a estrutura encadeadora e fluída. Procuro, mas torna-se difícil chegar lá.
Uma frase, depois mais outra. Faço um parágrafo, volto a ler. Não gosto, não sinto entrusamento com o meu ser. Parece que são meros arranjos de palavras que ali estão. Paro um pouco pra espairecer, beber um café, ver um episódio de uma série Os amigos de Brian.
Volto ao computador, cheia de energia, que aliás nunca abandonou a minha mente, tal é o buliço de ideias, pensamentos acerca do discurso que pretendo e anseio colocar no papel. Finalmente o desabafo: porra! é apenas um trabalho. O primeiro, não será concerteza o último. Não sei se tem mesmo que ver com a nota. Sinto que o que me importa mesmo é que seja algo que possa valorizar. Valorizar-me a mim. O que aliás parece estúpido, agora que penso e efectivamente o escrevo. Não me vou valorizar ou desvalorizar por causa de um trabalho, talvez nem o meu futuro dependa desse trabalho. Investigar, questionar, perscrutar, e agora parece-me mesmo que o melhor é procrastinar.
Procrastinar será, é o que está enraizado nesse inconsciente que não tenho capacidade de verbalizar oralmente, e daí a psicossomática, sinal do que sinto?! Mas não podia ter ficado simplesmente com a ligeira dor de cabeça, tinha de me atacar as amígdalas! Essas massas de tecido linfóide que estão na entrada da garganta, e que pelos vistos tinham que dar sinal mais que percebido no seu sentido psicológico, sentido neste corpo que é meu e que neste instante sinto não cooperante. E pensar que é no facto de eu possuir a linguagem que me permite descrever o que sinto que reside o facto desse sentir, e não outro, existir.
Não leio mais hoje, e vou tentar não esquecer-me da última frase que acabo de ler:
“O projecto como uma construção racional é, hoje, uma grande ferida que nos faz desconfiar dos nossos sonhos, temer sonhar conjuntamente e fabricar algo mais terrível que a realidade (...). Os nossos sonhos não dizem mais do futuro, como os antigos oráculos, ou as utopias dos séculos anteriores, mas decifram-nos interminavelmente o passado. O passado de uma razão triste, cuja crise pode ser vista e sentida nessa outra crise que é a da imaginação” (Afonso, 1986, p. 17).
É essa imaginação que neste momento me falta. Ou então decidiu ir passear, sem me avisar com antecedência, sem me dizer para onde foi. Logo agora, que precisava tanto dela para me ajudar a elaborar o pensamento. Só me apetece mostrar-te a língua! Volta quando quiseres :p
Referência:
Afonso, L.. (1986) Viagens as Utopias: Crise no Imaginário Social, Revista Cadernos de Psicologia, V. 1 , n º 2. (p. 5 a 18). Belo Horizonte, ed. UFMG,.

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